Por que escrevemos? Qual a razão desta força, quase compulsão, que nos leva, às mais das vezes, a escancarar o próprio coração? Queremos conversa conosco mesmos? Esta prosa que traduzimos através das palavras, que se nos brota, sensivelmente, deve necessariamente ter um destino. Não falamos sozinhos. É fundamental a quase certeza de que alguém mais compartilha dos nossos interesses, caminha quem sabe o mesmo caminho, olha o mundo e os homens e os vê com as mesmas cores com as quais os revestimos. Há certa angústia nas palavras do escriba. Principalmente aquele que compõe esta apressada literatura de vinte-e-quatro horas, aquela que se extingue, gostosamente, à luz do sol poente. É preciso ouvir a voz durante este dia de alguém que nos diga alguma coisa. E que importa que seja a crítica acerba, que nos machuque, porque mesmo ela com a dor que carrega no seu bojo nos adverte da existência do mundo. É boa a mão que afaga. Também nos estimula a mão que agride.
Mentem para si mesmos os que afirmam que lhes não importam quantos os lêem, porque tenho certeza, comovidamente, que é profundamente construtivo o aperto de mão, aquele telefonema apressado, a simples palavra que nos garante a comunicação. E sabem por que nos interessam os amigos e leitores? Se pudéssemos colhê-los todos os dias quem sabe os agradássemos conhecendo-lhes os próprios sentimentos. E posso lhes garantir que tenho vertido neste canto-de-coluna, nestes últimos anos muito de mim mesmo. Sem medo. Utilizo, às vezes, a ironia, a brincadeira, tipos que vivem em mim mesmo, com os quais converso, para com tudo isto dizer exatamente o que penso.
Na verdade, meus amigos, eu me descobri depois dos cinqüenta anos. Não tive tempo antes de enxergar este companheiro que sou, o amigo das madrugadas, o apreciador de serestas e barzinhos sorridentes. Pois foi através desta descoberta, do novo amor que me oferto, foi através dele que pude ver melhor e mais de perto os que amo. Ama-se, decididamente, melhor o próximo e quase efetivamente quando se ama a si mesmo. Por isso eu quis dizer-lhes e o tenho feito, tudo o que sinto e penso, de mim e da vida, para nosso melhor convencimento, principalmente do quanto nos devemos amar.
Há muito tempo eu estava querendo mandar-lhes este bilhete, a todos os que me lêem, para afirmar-lhes, mais uma vez, que eu existo porque vocês existem. E tenho certeza e preciso dela para continuar a escrever-lhes. Passo a semana a selecionar os meus assuntos, estes com os quais descubro, diante de mim mesmo e da vida, a beleza das coisas. E preciso sentir que a prosa escorre dos meus dedos, porque foi toda ela já composta aqui dentro, sei lá onde - se nos cantos coloridos do coração ou nas volutas sonhadoras do cérebro. Deve ser uma associação entre eles - cérebro e coração, para que se tenha o produto mais legítimo do amor definitivo. Gostaria de dizer-lhes o próprio nome, chamar-lhes pelo apelido e olhar nos olhos. Isto faz bem. Nada mais nos aproxima do que a luz que refletimos aqui de dentro. Parece que os olhos guiam, desde aqui fora, os nossos sentimentos, o convencimento, a amizade, e leva tudo isto com a própria luz, lá para os refúgios do amor eficiente.
Os amigos não se desculpam. Quando muito toleram-se. Por isso eu quis que as palavras viessem sozinhas, aqui se colocassem em filas ordenadas, mas que trouxessem exatamente o que vive em mim. O desejo de conviver. Que é muito mais importante do que viver. Conviver mesmo, com o meu quotidiano, com o companheiro, a família, a cidade, a minha igreja. E com o Corinthians. Conviver intensamente, todos os minutos, exageradamente, como faço nas minhas aulas, com os meus alunos, quando ocupo os quatro cantos. Não só da sala, dos tímpanos ali dispostos e dos olhos assustados dos que me vêem pela primeira vez. Mas vale a pena.
Gosto de estar só para me lembrar do momento em que estive com você.
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